sábado, 5 de setembro de 2015

Após fazer a sucessora, Lula é desfeito por ela

Na sua mais recente passagem pelo Palácio da Alvorada, na noite de quinta-feira, Lula encontrou uma Dilma aturdida, às voltas com o risco de perder as duas muletas de sua presidência. Horas antes, ela havia toureado a insatisfação de Joaquim Levy, seu apoio econômico, que flertava com a porta da rua. Na véspera, ela tomara um toco de Michel Temer, sua escora política, que se negou a reassumir a articulação do Planalto com o Congresso.

Vendeu-se a versão de que Lula voara a Brasília para socorrer sua afilhada política. Falso. O mentor de Dilma foi à Capital para tentar salvar a si mesmo. Sua pupila realiza um governo caótico. O enredo da campanha perdeu a validade. E nem o marketing de João Santana foi capaz de colocar uma narrativa nova no lugar. Disso resultou um fenômeno político raro: depois de fazer a sucessora, Lula está sendo desfeito por ela. E tenta brecar o processo de desconstrução.

Enquanto o criador dava conselhos à criatura em Brasília, Temer fugia do seu comedimento usual para dizer a um grupo de empresários o que só era balbuciado em privado: “Hoje, realmente, o índice [de aprovação do governo] é muito baixo. Ninguém vai resistir três anos e meio com esse índice baixo. […] Se continuar assim, eu vou dizer a você, 7%, 8% de popularidade, de fato, fica difícil.”

Temer soou raso e inepto. Foi raso porque insinuou o risco de impeachment com uma leveza incompatível com a gravidade do tema. Foi inepto porque bem sabe, como professor de direito constitucional, que impopularidade não é motivo para a cassação de um mandato presidencial. Exige-se a prática de um crime de responsabilidade. Algo que, por ora, não se encontra sobre a mesa.

Seja como for, a impopularidade evocada por Temer é real. E ajuda a explicar a inquietação de Lula. Graças a Dilma, o animador de massas do PT está perdendo seu capital político mais valioso: as ruas. Pior: Lula já não dispõe de um FHC para chutar. Dilma colhe o que plantou sozinha: juros, inflação, contas públicas escangalhadas e desemprego. O fiasco da gerentona converteu a legitimidade das urnas recém-abertas em falta de credibilidade.