O processo de
colonização ocorrido no Brasil, especificamente no interior nordestino, que se
deu nos séculos XVII e XVIII teve suas consequências também idênticas na
localidade de Japi: com a extinção da
tribo Cariri no Boqueirão, fato esse, denominado de (Guerra dos Bárbaros); a chegada dos posseiros: “(O Cruz, Belo e Monte, que eram
dois padres, Adelino, que construiu
o cemitério, O Costa, primo de Pedro
Tolentino da Costa, Miguel Lourenço da Costa, Pedro Tolentino
da Costa, também primo de Miguel Lourenço da Costa)”; as primeiras fazendas;
os matadores de onças; a criação de rebanhos e o desenvolvimento da produção
algodoeira.
(SANTOS; 2018, Pp. 24-32).
O texto a seguir foi extraído do livro JAPI, TERRA QUERIDA em fatos e fotos,
que agora está confirmado pela Edtora:
CJA LTADA - ME. A data da publicação será: 13/01/2018, num sábado, a partir das 19:00h, no prédio da E.E.Cel.
Manoel Medeiros II.
Os descendentes indígenas foram escravizados ou
refugiados no sertão, sendo também perseguidos e mortos pelas terríveis
guerrilhas, organizadas pelos grandes proprietários de terra para expulsarem os
índios do interior OS PRIMEIROS POVOS: OS ÍNDIOS CARIRIS E TAPUIOS
Sabe-se
através de registros históricos que no interior do Rio Grande do Norte
predominavam os Tapuias, também chamados de Cariris. Vale saber, também, que os
Cariris eram as tribos indígenas que habitavam nas áreas interioranas do Estado
até o final do século XVIII. Os estudos comprovam que eles eram divididos em
tribos como: Panati, Caicó, Peba e Tarariú, que habitavam o Seridó e o Trairi.
Por causa dos
vestígios que nós encontramos em todos os arredores do nosso município, fica
evidenciada a existência de muitos índios aqui neste torrão há centenas e
milhares de anos. A saber, nas localidades de Letreiro, Tubiba, Salgado,
Casinha, Japi de Dentro e Boqueirão de Cima. Acredita-se, com base em várias
evidências, que a tribo que aqui viveu foi a Cariri.
Os nomes[1]
dos povos indígenas são escritos conforme a “convenção para grafia dos nomes
tribais”, adotada em 1953. Assim, os nomes tribais, excetos os de origem
portuguesa, não sofreram flexão de número (FELIPE; CARVALHO, 2002, p. 8).
Cariry – grupo étnico que outrora
ocupou grande extensão do Brasil para o norte de Pernambuco, Paraíba, Rio
Grande do Norte e Ceará. Cariry é o mesmo que Kiriri, que significa:
silencioso, calado (FELIPE; CARVALHO, 2002, p. 9).
Foto: Google
1.1.1 A guerra dos bárbaros
Para Silva (2003, p.11),
Quando o interior potiguar foi ocupado pelos colonizadores,
ocorreu a chamada Guerra dos Bárbaros. Nesse período, houve muito derramamento
de sangue no Rio Grande do Norte (1687-1797). Tribos inteiras, do litoral ao
interior do Estado, como Tapuia, Pega, Caboré e outras, foram levadas à
completa extinção (SILVA, 2003).
Com o processo de colonização, o surgimento de propriedades no interior do Nordeste e o avanço dos poceiros, muitos índios morreram em combate, pois ficavam em desvantagem com seus armamentos, em que o arco e o tacape nada podiam diante das armas de aço e de fogo (o mau espírito trovejante) e da astúcia dos capitães de campo. Alguns fugiram para outra localidade do interior do Estado, negando-se ao trabalho como escravo.
Em muitos combates, algumas tribos foram completamente extintas. Foi o
que ocorreu, no século XVIII, com os Cariris que moravam no Boqueirão de Cima,
próximo à Fazenda Japi de Dentro. Naquela época, o interior do Rio Grande do
Norte e da Paraíba ainda vivia o processo de colonização. As províncias
incentivavam a escravidão ou a matança dos índios, fato descrito pelos
historiadores de Guerra dos Bárbaros.
Com efeito, ainda segundo Silva (2003, p. 12),
a Guerra dos Bárbaros (1687-1697) exterminou a maioria
da nação indígena na capitania do Rio Grande do Norte.
do Estado, tomando assim posse da terra para pasto de
gado dos fazendeiros colonizadores.
O tempo de duração desse conflito interessava
diretamente aos invasores que, conscientes do seu poderio militar, nada faziam
para pôr fim à guerra, pois quanto mais tempo ela permanecia, mais terras eram
conquistadas.
No final da Guerra dos Bárbaros, a população indígena
estava reduzidíssima. Os que sobreviveram entraram paulatinamente num processo
de miscigenação e de aculturação com a população branca, de origem portuguesa,
e com os negros de origem africana. Somente após o esmagamento dos índios no
século XVII, pôde a colonização portuguesa consolidar-se no interior potiguar
ao longo do século XVIII.
1.2 A CONQUISTA DO SERTÃO
1.2.1 A chegada dos posseiros
Tropeiros foto: portaldorancho
Assim surgiram as primeiras propriedades e os primeiros pequenos
proprietários. De acordo com Silva (op. cit., p. 14), “o posseiro, egresso,
muitas vezes, das bandeiras e entradas que se internavam nos sertões à procura
de índios, agarrava-se à terra, dominando-a, conquistando-a para possuí-la de
modo amoroso, mas egoístico”. E fazia mais: nas suas entradas pelo sertão, perseguindo
a ferro e fogo o gentio bravo, batizava a terra, domava as feras, abria
picadas, veredas e estradas, vadeava os rios, subia e descia as serras deixando
por toda a parte o traço marcante da sua personalidade e do seu engenho. Rios,
córregos e riachos, lagos e lagoas, poços e fontes, serras e serrotes,
caminhos, veredas e estradas, cacimbas e vertentes, olhos d’águas, barreiros,
árvores, astros e aves, vegetais e plantas, todos, à sua passagem, perdiam o
estado de natureza selvática, adquirido de graça e tendo o seu destino ligado a
nomes de gente, de santos, de acidentes geográficos, de peixes, de árvores, de
aves domésticas.
Silva (2003, p. 14) também afirma:
Com as melhores terras ocupadas pelo gado e pelos
canaviais dos grandes proprietários, restavam as terras mais secas para serem
apossadas. Começou a odisseia dos posseiros, que vinham de regiões da Paraíba,
homens brancos, pardos e mesmo negros fugidos das senzalas, seguindo o curso
dos rios, que em época de seca se transformavam em estradas, embrenhando-se na
caatinga, saco nas costas, armas de fogo no ombro, caçando índios, matando
onças, animados em assentar os primeiros currais, tangendo um touro e três
novilhas (essa era a base da pecuária familiar), fincando palhoça nas
ribanceiras dos rios, como informa Câmara Cascudo (1968), “e lá ia plantar
choça de palha, taipa de bofete, matando onça a terçado e paiacu a tiro de
clavinote. Tangia um touro, duas vacas, casal de cabras... chegava e ia ficando
colono de si mesmo, alimentado pela esperança de sobrevivência. Que quando a
sorte batia, a fartura crescia, surgiam assim os grandes proprietários”.
Os primeiros posseiros que tentaram viver nesta localidade não conseguiram
permanecer porque não tiveram condições de enfrentar as dificuldades e desafios
que lhes puseram à prova. Sabe-se que viveram aqui no início do século XIX, por
volta de 1805 a 1825. Isso se deu logo após a extinção da tribo Cariri que
vivia no Boqueirão do Japi. Veja o nome deles: Zé de Góes, Adelino, o Cruz e
Belo Monte. Mais tarde, ainda na primeira metade do século XIX, chegou aqui, o
Costa[2].
Em 1850, chegou o grande desbravador Miguel Lourenço da Costa. Ele veio
trazido pelo pai, para tentar a sorte aqui nas terras do Japi. Ele foi o
posseiro que permaneceu até a morte nesta localidade. Foi ele e seus
descendentes que deram início ao povoamento da cidade de Japi.
Mais tarde, no final do século XIX, Aninha Geraldo e Joaquim Geraldo,
seu esposo, apossaram-se da terra que era do Costa. No início do século XX,
esse casal foi expulso e fugiu para cima da Serra Grande, onde se apossou de
quase toda a chã daquela Serra.
Segundo Leôncio Miguel, o Costa era parente de
Miguel Lourenço. Talvez tenha sido por isso que Aninha Geraldo tenha ficado com
suas terras.
1.2.2 Os proprietários das fazendas Japi de Dentro
No dia 16 de fevereiro de 2006, fui à localidade do Trairi, com o objetivo de encontrar um homem
que nascera na Fazenda Japi de Dentro. Este senhor é parente do tenente que
junto com outros homens comandaram, há dois séculos, a ação que exterminou a
tribo indígena que habitava no Boqueirão de Cima, próximo à fazenda Japi de
Dentro.
Por volta das 18 horas desse mesmo dia, encontrei realmente a pessoa
que eu procurava: O ancião de 84 anos, que estava acompanhado por um dos
filhos. Os dois estavam trabalhando na
beira do Açude do (...).
Depois de fazer perguntas a respeito de seus familiares, o ancião me
respondeu: “Meus bisavôs possuíam a fazenda Japi de Dentro, situada nas chãs da
Serra Grande e de Serrinha, ficando a maior parte no território paraibano, no meado do século XVIII”.
Continuei a conversa com o ancião e ele me disse que seus quatros avós
faleceram entre a segunda metade do século XIX e a primeira metade do século
XX. Conversávamos ainda, quando ele me disse que o avô materno era o fazendeiro
que possuía mais bens naquela localidade e que, depois de sua morte, deixou uma
grande fazenda com 50 cabeças de gado, quatro cavalos, um burro de sela, um
chiqueiro cheio de ovelhas, outro cheio de bodes e duzentos alqueires[3] de
farinha.
O ancião me disse ainda que, quando o seu avô materno
faleceu, um dos filhos apropriou-se de quase tudo que ele possuía. Ele falou
também que as terras que eram dos filhos de José Anselmo Pinheiro, antes
pertenciam a um de seus tios.
Dizem que o homem que vendeu as terras a José Anselmo Pinheiro não
mantinha boas relações com os proprietários vizinhos. Tanto que quando ele
vendeu essa terra, as pessoas que moravam na vizinhança agradeceram a Deus, por
saberem do ocorrido e até compraram um brinde para presentear o novo
proprietário, José Anselmo Pinheiro.
1.2.3 O massacre do Boqueirão
Segundo o ancião informante, por volta de 1802, o seu bisavô juntamente
com outros fazendeiros denunciaram os índios cariris. Esses fazendeiros estavam
chateados com os insistentes ataques dos nativos aos seus rebanhos. Por isso,
prestaram queixa ao governo da província da Paraíba, exigindo dele urgente
providência, porque não estavam suportando mais a presença daqueles nativos em
suas propriedades.
Na ocasião, os proprietários da fazenda Japi de Dentro alegaram às
autoridades paraibanas que além dos índios estarem destruindo os rebanhos das
fazendas, também representavam uma ameaça e medo aos fazendeiros e seus
familiares. E, atendendo às solicitações dos proprietários, as autoridades da
Paraíba, que também naquela época ainda conservavam vivo o espírito invasor e
destruidor das guerrilhas dos bárbaros, agiram imediatamente enviando um
batalhão de policiais, o qual veio bem armado e comandado por um tenente filho
do fazendeiro (mencionado na seção conhecedor
daquela região, porque ali ele fora criado.
Segundo o informante, a tropa enviada pela província era composta por
aproximadamente 250 policiais, vindos todos da Paraíba. Além do tenente,
contaram também com o auxílio de alguns proprietários de localidades próximas,
de jagunços e de um índio[4]
manso, que pertencera à mesma tribo.
Por causa da contribuição do “índio manso”, que foi guiando, ensinando,
onde, quando e como deveriam fazer para pegarem todos os índios de surpresa, o
ataque ocorreu subitamente sem chance para os nativos se defenderem e nem sequer
fugir. Pode até ser que algum deles tenha escapado, porém não temos concretas
informações disso.
A estratégia que os fazendeiros e as autoridades da Paraíba usaram para
destruir os índios foi parecida com a maneira usada pelos colonizadores, fato
esse já mencionado antes nesse capítulo, que ficou conhecido historicamente
como “Guerra dos Bárbaros”: ação cruel, desumana e radical. Segundo o
informante, esse massacre dizimou aproximadamente dois mil nativos da tribo
cariri, que moravam no Boqueirão, às margens do rio Jacu.
Foto:wikipedia
O informante detalhou que os cariris se encontravam dormindo, quando o
tenente apontou uma arma em direção a uma rede que estava pendurada entre
alguns “ganchos” de uma grande craibeira que se encontrava no meio do rio Jacu,
na qual estava o cacique Xatau. Em poucos segundos: um tiro,
dois tiros. O cacique caiu morto no tronco da craibeira. Esse índio, além de
cacique, era um vigilante da tribo.
Enquanto os índios se levantavam tonteados e assustados, os soldados
iam fazendo o cerco e deixando um amontoado de mortos. Assim, como tudo foi bem
planejado, após matarem o cacique, mais de 50 soldados, bem armados com fuzis,
garruchas e espadas, ficaram posicionados atrás das pedras próximas ao local
onde se encontravam as armas dos índios, só esperando a chegada dos nativos,
pois, com certeza viriam pegá-las. De fato, próximo a esse local foram mortas
centenas de cariris. Soldados, em cima de árvores, atrás de pedras, de troncos
de árvores e bem posicionados, fuzilavam e matavam os que tentavam escapar do
cerco. Enquanto isso, o tenente dava ordem para outro grupo de militares atacar
e avançar em direção aos índios.
O massacre do Boqueirão[5]
começou ao “quebrar da barra” (ao amanhecer), logo depois que o índio manso
roubou todas as armas da tribo, as quais ficavam guardadas numa loca de pedra
durante a noite, e findou na parte da tarde, quando o sol já se encobria por
trás do imenso paredão da serra, que se estende na direção do poente.
Os soldados já estavam se reunindo para ir embora quando de repente
perceberam algo correndo entre as pedras: era uma pequena e, talvez, única
sobrevivente índia que corria desesperada pulando as pedras do rio Jacu,
perseguida pela guerrilha que acabara de exterminar seu povo; ela na sua
desesperada corrida lembrava as águas do Jacu quando tudo era paz. Agora estava
ali, sozinha, acossada. Sua família, o pajé, seus amigos, todos mortos. Seus
passos diminuíram. Sentia-se cansada. Até que a tropa a encontrou caída numa
loca de pedra. O tenente que era parente do fazendeiro e
que comandou o massacre resolveu levá-la com vida. Quando ele aproximou
a mão no ombro da jovem nativa, foi surpreendido com uma violenta mordida
desferida pela índia. Essa mordida foi tão forte que o dedo polegar da mão
esquerda do tenente foi decepado e caiu em seus pés. Nesse instante, o tenente
trêmulo e transtornado de dor puxou a espada da bainha, e com ela feriu a
jovem, matando-a a golpes, no meio do rio Jacu, aquela corajosa índia da tribo
cariri que habitava no Boqueirão, situado entre as serras do Japi de Dentro.
Cariry – grupo étnico que outrora ocupou grande extensão do Brasil, da
Bahia para o norte de Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte e Ceará. Cariry
é o mesmo que Kiriri, que significa: silencioso, calado (SOARES, 1930).
Nenhum comentário:
Postar um comentário
ATENÇÃO LEITOR: O Blog não se responsabiliza pelas opiniões e comentários. Em geral, o nosso Blog não analisa nem endossa o conteúdo dos comentários, principalmente os comentários postados pelo Facebook; Não permitimos o uso de linguagem ofensiva, spam, fraude, discurso de violência, comportamento violento ou negativo, conteúdo sexualmente explícito ou que invada a privacidade de alguém.
IMPORTANTE: Este Blog aceita comentários anônimos mas repudia a falsidade ideológica. Recomendamos aos leitores utilizarem o seu nome, sobrenome e e-mail (caso tenha algum), dos quais sejam legítimos para identificação.
Seu comentário será enviado para o moderador.