DESEJOS OU UM TEXTO
SOBRE
MEDIDAS.
(Maciel)
Num mundo balanceado pelos opostos
noite/dia, doce/salgado, bom/mal, céu/inferno, alegria/tristeza... desejo que
seja entre o espelho e a balança a antítese para o nosso imaginário de Narciso,
no estímulo de reflexos, reflexões, atentos ao peso e a cintura disforme ou sob
medida, com o protesto aqui pela constatação de que as balanças perderam espaço
na generosidade das farmácias, de onde desapareceram quase em sua totalidade e
por isso pensei numa lei obrigando balanças em espaços públicos. Já espelhos, obrigatórios
só para os homens. As mulheres já os têm.
Há pouco li no facebook sobre o
desejo de um jovem ansioso para que a festa do padroeiro da cidade chegue logo.
É um pedido e sei dos seus dias por não vê-los passar, de sua sinceridade ou da
sinceridade neste ou deste tipo de desejo ou de nossos desejos mais íntimos.
Mas, menos mal, lembro que li por aí, “Um dia de cada vez para ver inteirar um
ano” e aprendi com Bil Gates que “a vida não é dividida em semestres” ou, de
Jesus, percebe-se a ênfase no hoje, por isso devemos fugir dos marcadores,
apesar de que o mundo bem que poderia ter se acabado em 2012 pelo nosso esforço
em destruí-lo.
Em minha opinião, e que eu me lembro,
com exceção apenas do calendário de pagamento do estado, todos os demais medidores
não são bem vindos. Até a data do meu aniversário não me é tão especial, se o
argumento é o de que a máxima se dá apenas porque a terra completa um giro em
torno de si mesma e do sol, sendo que isso independe de mim: Gozagão foi
festejado aos cem anos sem nem estar aqui.
Jesus nos ensinou a desconfiar de
certos pedidos: “Pedis, e não recebeis, porque pedis mal”. E
quando o desejo é para com o outro, aprendi com o mestre que aquilo que desejo
deve começar dentro de mim e vice-versa, claro.
Foi após sua ressurreição que
apareceu onde os seus discípulos estavam escondidos, com medo dos seus algozes,
após testemunharem o que fizeram com seu líder. Se com o Cristo acontecera a
morte de cruz, pena máxima naqueles dias, seus seguidores se consideravam ameaçados
e sem alguém para direcioná-los. Foi neste contexto confuso que Jesus surgiu e
os reanimou com o imperativo desejo de A PAZ SEJA CONVOSCO! Mas não
foi um desejo de paz no vazio, como não seria da parte de Jesus um desejo para
um bom dia, para um feliz ano novo, pois ao desejar a paz ele próprio estava
ali para PROMOVÊ-LA. Jesus era diferente de nós e não diria “vai em paz” sem
antes satisfazer as nossas necessidades mais elementares.
É sábio quem pode, procura, tenta ou
exercita o viver intensamente cada momento, pois nos basta a rapidez do
tempo, a irrefutável fórmula da velocidade, a precisão do relógio, a
angústia do calendário com validade estabelecida e, afinal, se eu já passei dos
quarenta, pra que pressa? No tempo presente, pensando bem, por motivos triviais
não mais tenho desejos de que o amanhã chegue logo, se caminho para “a melhor
idade”, dias nos quais direi “não tenho neles prazer”, “só canseira e enfado”
ou, metaforizando com Manuel bandeira: Que importa a paisagem, a Glória, a
baía, a linha do horizonte?
— O que eu vejo é o beco.
— O que eu vejo é o beco.
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